domingo, 23 de novembro de 2014

A máquina de fazer espanhóis

“a vida tem dessas coisas, quando não esperamos mete-nos numa grande história. bem, ou num grande poema, que também acaba por contar uma história”.

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A máquina de fazer espanhóis, de Valter Hugo Mãe, conta a história de António Silva, um português de 84 anos que perde a esposa após 48 anos de vida em comum. Logo após a morte da companheira sua vida muda drasticamente, seus filhos nao têm mais tempo para ele e, de certa forma, o obrigam a viver em um asilo.
A história de António Silva tem um quê de melancolia, nos deparamos com um homem letárgico, entristecido pela morte recente da esposa, que sente-se abandonado pelos filhos e que tem como única saída adaptar-se a seu novo e diferente modo de vida. Apesar de viver acompanhado por outras pessoas, na mesma situação que a sua, nao deixa de sentir-se solitário, passa os dias perdido em suas lembranças do passado e suas dúvidas acerca do futuro. No início da narrativa António Silva é um homem avesso a conversas, ensimesmado e entorpecido pela dor da perda.


“perdemos alguém, e temos de superar o primeiro inverno a sós, e a primeira primavera e depois o primeiro verão, e o primeiro outono. e dentro disso é preciso que superemos os nossos aniversários, tudo quanto dá direito a parabéns a você, as datas da relação, o natal, a mudança dos anos, até a época dos morangos, o magusto, as chuvas de molha tolos, o primeiro passo de um neto, o regresso de um satélite à terra, a queda de mais um avião. as notícias sobre o brasil (...) o tempo guarda cápsulas indestrutíveis, porque, por mais dias que se sucedam, sempre chegamos a um ponto onde voltamos atrás, a um início qualquer, para fazer pela primeira vez alguma coisa que vai nos dilacerar impiedosamente, porque nessa cápsula se injecta também a nitidez do seu rosto, que por vezes se perde mas ressurge sempre nessas alturas, até o timbre da sua voz, chamando o nosso nome ou, mais cruel ainda, dizendo que nos ama com um riso incrível pelo qual nos havíamos justificado em mil ocasiões no mundo”.


Porém, no decorrer da história, nosso protagonista sai de seu casulo e vai recuperando o humor e a alegria pouco a pouco. A vontade de viver, perdida a partir da morte da esposa e do abandono dos filhos, é recuperada no momento em que ele decide se relacionar com os outros moradores do asilo. António Silva inicia uma relação de amizade e companheirismo com as outras personagens: o Américo, o Doutor Bernardo e o espetacular Esteves sem metafísica.
Toda a narrativa leva o leitor a refletir sobre a sociedade portuguesa, sobre a política na época da Ditadura de Salazar – que marcou profundamente a vida das personagens -, sobre o amor na terceira idade, sobre a solidão decorrente da senilidade, sobre o valor da amizade e do companheirismo e, sobretudo, sobre a dor da perda. O autor faz um relato brilhante sobre a velhice e sobre a morte que, nessa altura da vida, é inexorável.


“um problema com o ser-se velho é o de julgarem que ainda devemos aprender coisas quando, na verdade, estamos a desaprendê-las, e faz todo o sentido que assim seja para que nos afundemos inconscientemente na iminência do desaparecimento. a inconsciência apaga as dores, claro, e apaga as alegrias, mas já não são muitas as alegrias e no resultado da conta é bem visto que a cabeça dos velhos se destitua da razão para que, tão de frente à morte, não entremos em pânico. a repreensão contínua passa por essa esperança imbecil de que amanhã estejamos mais espertos quando, pelas leis mais definidoras da vida, devemos só perder capacidades. a esperança que se deposita na criança tem de ser inversa à que se nos dirige”.


Além de escrever sobre a derradeira fase da vida de uma forma admiravelmente bela, Valter Hugo Mãe me conquistou mais ainda por ter dado vida ao Esteves sem metafísica. Sim, ele mesmo, do famoso poema Tabacaria, de Álvaro de Campos. Adorei sua criatividade e coragem para tomar posse de uma personagem de Fernando Pessoa, isso acabou me fazendo lembrar de Saramago que se apropriou de um dos heterônimos de Pessoa para escrever o sensacional “O ano da morte de Ricardo Reis”.
Hugo Mãe tem uma forma bastante peculiar de escrever, ele não costuma utilizar letras maiúsculas, o que dá um charme todo especial à escrita. Aliás, é justamente isso que tanto me agrada nele, pois além da capacidade de emocionar o leitor com a sensibilidade de suas personagens, sua forma tão sua, tão própria de escrever, conquista quem o lê.
Adorei A máquina de fazer espanhóis, me encantei com a forma como é contada a história e indico para todos aqueles que, como eu, gostam de livros delicados e emotivos.

Sobre o autor:
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Valter Hugo Mãe é um escritor português, nascido em Angola, em 1971. É ainda jovem, mas com uma carreira literária de causar inveja. Vencedor de vários prêmios literários, como o conhecido Prêmio José Saramago, e com um talento fora do comum para criar personagens fortes e ao mesmo tempo emotivos, Hugo Mãe conquistou respeito, admiração e um lugar respeitável na literatura portuguesa contemporânea.

Um vídeo do poema Tabacaria:

“Não sou nada
Nunca serei nada
Não posso querer ser nada
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo”.

sábado, 15 de novembro de 2014

Manoel por Manoel

“Ao nascer eu não estava acordado, de forma que não vi a hora. Isso faz tempo. Foi na beira de um rio. Depois eu já morri 14 vezes. Só falta a última.”


Manoel de Barros 
"Eu tenho um ermo enorme dentro do olho. Por motivo do ermo não fui um menino peralta. Agora tenho saudade do que não fui. Acho que o que faço agora é o que não pude fazer na infância. Faço outro tipo de peraltagem. Quando eu era criança eu deveria pular muro do vizinho pra catar goiabas. Mas não havia vizinho. Em vez de peraltagem eu fazia solidão. Brincava de fingir que pedra era lagarto. Que lata era  navio. Que sabugo era um serzinho mal resolvido e igual a um filhote de gafanhoto.
Cresci brincando no chão, entre formigas. De uma infância livre e sem comparamentos. Eu tinha mais comunhão com as coisas do que comparação.
Porque se a gente fala a partir de ser criança, a gente faz comunhão: de um orvalho e sua aranha, de uma tarde e suas garças, de um passáro e sua árvore. Então eu trago de minhas raízes crianceiras a visão comugante e oblíqua das coisas. Eu sei dizer sem pudor que o escuro me ilumina. É um paradoxo que ajuda a poesia e que eu falo sem pudor. Eu tenho que essa visão oblíqua vem de eu ter sido criança em algum lugar perdido onde havia transfusão da natureza e comunhão com ela. Era o menino e os bichinhos. Era o menino e o sol. Era o menino e as árvores."
(trecho retirado de 'Memórias Inventadas - A Segunda Infância')





Grandes mestres da literatura brasileira se foram neste ano: João Ubaldo Ribeiro, Rubem Alves, Ariano Suassuna e, agora,  Manoel de Barros. Todos deixarão saudades.
Manoel de Barros, porém, era o meu preferido; ele não deixará saudades apenas, deixará o Brasil mais pobre de poesia.
Sentirei sempre falta de suas palavras que encantam.
Ainda bem que ele deixou um legado enorme, pois quando a saudade bater com força, poderemos ler e reler sua obra.






Com tanto escritor de qualidade partindo a biblioteca do paraíso ficará garantida!
 
Descanse em paz, poeta!

domingo, 9 de novembro de 2014

Vamos compartilhar livros, pessoal?

"(...) era uma pena a falta de leitura não se converter numa doença, algo como um mal que pusesse os preguiçosos a morrer. Imaginava que um não leitor ia ao médico e o médico o observava e dizia: você tem o colesterol a matá-lo, se continuar assim não se salva. E o médico perguntava: tem abusado dos fritos, dos ovos, você tem lido o suficiente? O paciente respondia: não, senhor doutor, há quase um ano que não leio um livro, não gosto muito e dá-me preguiça. Então, o médico acrescentava: ah, fique pois sabendo que você ou lê urgentemente um bom romance, ou então vemos-nos no seu funeral dentro de poucas semanas. O caixão fechava-se como um livro." 

Eu gosto muito do trecho acima, retirado do livro 'O filho de mil homens', do escritor português Valter Hugo Mãe. Gosto porque acho engraçado, mas sobretudo porque remete à importância da leitura... E toda vez que eu penso na importância de ler e compartilhar livros, lembro do BookCrossing Blogueiroum projeto superbacana organizado pelo blog da Luz de Luma, que tem como principal objetivo a propagação da leitura. A 9ª edição do BookCrossing acontece de 8 a 16 de novembro.

Fiquei por dias pensando sobre o que escreveria, como conseguiria passar toda a admiração e entusiasmo que sinto pelo projeto, mas acabei mesmo sem nenhuma ideia inovadora. Portanto, a única coisa que posso dizer é que a leitura é uma das coisas mais maravilhosas da vida; a leitura nos leva para outros mundos, nos faz pensar e refletir sobre diversos assuntos, nos faz viajar para lugares desconhecidos e por vezes encantadores, faz aumentar nosso conhecimento e também nosso vocabulário, enfim, há inúmeras razões pelas quais a leitura não deve deixar de fazer parte do nosso dia a dia. Sabendo disso, o ato de compartilhar livros se torna ainda mais satisfatório, porque além de doarmos os livros, com eles enviamos também todas as coisas boas, bonitas e interessantes que uma boa história é capaz de oferecer a um leitor.
Bom seria se neste mundo moderno, atualmente tão controlado pela tecnologia, em vez de celulares e jogos eletrônicos, as pessoas portassem mais livros... Seria uma delícia, né não?!
O meu desejo mais profundo é que essas pessoas realmente possam desfrutar dos livros que libertamos, que leiam e que voltem a libertá-los por aí, e que façam disso um hábito para toda a vida.


Decidi doar quatro livros. Alguns deles estão em português, por isso não posso doá-los aqui onde moro. Como da outra vez, pretendo enviá-los pelo correio para aquelas pessoas que estiverem interessadas. Basta apenas deixar um recadinho dizendo qual livro deseja receber. O envio será por ordem de chegada, quem pedir primeiro, leva.
Espero que vocês também se animem e decidam libertar aqueles livros que estão parados na estante.
Sim, pessoal, deixem os livros circular livremente e encantar outras pessoas mundo afora. :D

Livros que serão libertados:



O Guardião de Memórias, de Kim Edwards


Nada dura pra sempre, de Sidney Sheldon


Things Fall Apart, do escritor nigeriano Chinua
Este, por ser em inglês, será libertado aqui mesmo em Hong Kong


Os Descendentes, de Kaui Hart Hemmings






Participem! :)

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Do fundo do baú: Colonia del Sacramento!

Remexendo e organizando minhas fotos antigas, encontrei algumas que foram feitas em Colonia del Sacramento, no Uruguai. Já faz alguns anos que estive por lá, mas parece que foi ontem, porque as lembranças ainda estão fresquinhas na cachola.
Não sei se já comentei aqui no blogue, mas antes de vir morar em Hong Kong eu morei por quatro anos em Buenos Aires, na Argentina.
Apesar de ter mencionado Baires, não é sobre a capital portenha que eu quero falar, mas sobre Colonia del Sacramento, uma cidadezinha extremamente charmosa que fica no Uruguai, às margens do Rio da Prata, a apenas um pulo de Buenos Aires.



O farol

Praia afastada da cidade


Geralmente, as pessoas que moram na capital portenha e decidem visitar Colonia del Sacramento vão de manhã e voltam à noite, devido a proximidade é muito fácil e cômodo fazer a viagem; uma horinha só de balsa e chega-se do lado de lá. Porém, eu decidi ir com calma e ficar  três dias inteirinhos. Teria ficado muito mais se tivesse tido tempo, pois a cidadezinha é realmente uma graça e vale cada hora que se passa passeando e conhecendo.
Mesmo sendo uma cidade pequena não faltam cantinhos históricos e casarões charmosos e bem conservados pra ver. Há várias atividades legais que agradam o turista, desde visitar os museus da cidade, conhecer os restaurantes, observar o pôr do sol, como fazer pequenos passeios a pé; também há a possibilidade de alugar um carrinho de golfe e sair um pouco da cidade para conhecer as áreas mais afastadas (algo que eu fiz, achei divertido e recomendo).



Em uma esquina qualquer...




Calle de los Suspiros e o Rio de la Plata ao fundo

Colonia del Sacramento é a cidade mais antiga do Uruguai, foi fundada em 168o pelo português Manuel Lobo e é a única cidade do Uruguai com características bem lusitanas, bem diferente das outras cidades dessa região. Gostei imensamente da forma como os uruguaios recebem os visitantes, eles são simpáticos e fazem com que o turista se sinta em casa.
Foi justamente em Colonia del Sacramento que comi o doce de leite mais gostoso da vida (
lo siento, hermanos argentinos, pero es verdad!) e vi o pôr do sol mais lindo do mundo (não estou exagerando, gente, é sério!).


Uma janela charmosa

Esperando o pôr do sol...

Por do Sol mas lindo do mundo

Pôr do Sol mais lindo do mundo II


O centro de Colonia del Sacramento é simplesmente encantador, seus cantinhos históricos e seus casarões coloniais tão bem conservados fizeram com que em 1995 fosse declarado Patrimônio Histórico da Humanidade. Apesar de morar tão longe atualmente, ainda penso um dia fazer um passeio por lá outra vez. Colonia é lindinha demais, por isso merece mesmo uma visita demorada. :)



domingo, 27 de julho de 2014

Tem olhos, mas não vê!

Tem olhos, mas não vê. Essa frase combina direitinho comigo em algumas situações. Hoje, por exemplo, me dei conta de que há mais ou menos vinte anos venho ao mesmo lugar e poucas vezes reparei na beleza que ele possui.
Vocês podem até pensar: Caramba, vinte anos são anos que não acabam mais... Pois é, não posso deixar de assumir que sou cabeça dura.
Eu sempre fui uma pessoa fascinada por grandes cidades, acho que isso tem muito a ver com o fato de eu ter nascido em um lugar pequenino no interior do Maranhão. Naquela época, o meu maior sonho era morar em uma cidade enorme, do tamanho do mundo. Isso ocorreu pouco depois, porque aos oito anos eu me mudei desse povoado para uma cidade maior. O interior continuou me agradando de uma certa forma, mas só durante as férias! Queria morrer só de pensar na possibilidade de voltar a morar um dia em um lugar tão pequeno.


Vista da janela de meu apê!


O castelo da cidade construído em 1280

Desde que me mudei do interior desfrutei como ninguém das cidades gigantescas nas quais morei. Adorava o tumulto e o barulho tão tipicamente conhecido de lugares movimentados. Gostava, sobretudo, de ver muitas pessoas juntas, de saber que a qualquer hora do dia ou da noite era possível sair pra badalar. Adorava saber que os shoppings ficavam abertos até altas horas, mesmo aos sábados e domingos. Sinceramente, poucas vezes parei para pensar a respeito dos funcionários desses centros comerciais que precisavam trabalhar todo dia inclusive durante os feriados. Egoísmo meu, reconheço!


Igreja de Mayen - construída em 1911
A igreja e a antiga muralha

A antiga prefeitura e o mercadinho de flores

Centro comercial

Tempos depois, já casada, fui visitar o lugar de origem de meu marido: Mayen, uma cidadezinha do tamanho do nada encravada em um vale no meio da Alemanha. Bonitinha, é bem verdade, mas tão pequenina.
Sua população de 18 mil habitantes é formada principalmente por pessoas idosas. O centro comercial tem apenas duas ruas com algumas lojinhas. Até o Kaufhof, uma loja de departamento bem conhecida na Alemanha, fechou suas portas há alguns anos, creio que por falta de clientela... E e
ssas mesmas lojinhas às seis da tarde fecham, sem falar que aos sábados funcionam apenas até às 14h e durante os domingos e feriados não abrem. Também não tem shopping nem discoteca, em outras palavras, é uma cidade completamente parada.
Quando eu soube de tudo isso acerca de Mayen o meu sangue gelou e a primeira pergunta que me veio à cabeça foi:

- Mas a gente não vai precisar morar neste vilarejo, vai?
- Nãaaao, Day, meu trabalho na Alemanha sempre será em Berlim (Ufaaa, respirei aliviada!)
- Mas, só pra esclarecer, Mayen não é um vilarejo, viu?! Foi reconhecida como cidade em 1291. ( meu marido fez questão de deixar isso bem claro... rsrs)


Resulta que o tempo foi passando e as coisas que antes eram tão valorizadas por mim foram ficando em segundo plano, sem importância nenhuma. Eu fui percebendo que tumulto no lugar de me agradar começou a me irritar e tirar completamente a minha paz. Comecei a buscar, dentro das grandes cidades, bairros com tranquilidade para morar. 

Hoje, assumo com prazer que prefiro muito mais uma cidadezinha com segurança e sossego que uma metrópole onde nunca se está 100% seguro. É muito mais aconchegante e agradável viver em um lugar pequeno e calmo que numa cidade eletrizante.
Segurança e tranquilidade são coisas importantíssimas na vida de uma pessoa, eu sempre soube disso, mas precisei de anos pra me acostumar à idéia de que Mayen não era tão ruim assim como eu queria acreditar que fosse.
O tempo foi passando, a maturidade chegando, meus interesses mudando e eu comecei, finalmente, a enxergar Mayen com outros olhos.
Fui percebendo a beleza do lugar: sua arquitetura belíssima e antiga, suas ruelas charmosas, suas cafeterias que servem os bolos mais deliciosos que já comi, seus habitantes fechados, eu diria até meio carrancudos, mas ainda assim com um quê de amabilidade. Esses mesmos habitantes, depois de tanto tempo, ainda me olham com certo ar de curiosidade, mas eu já não me deixo mais intimidar e digo sem pestanejar: sinto-me bem em Mayen. É como se a cidade, de alguma forma, me fizesse ver a vida a partir de outro ângulo.




A cidadezinha é charmosa também à noite!

O castelo da cidade visto por trás

Eu não pretendo morar aqui agora, mas no futuro, em um futuro não tão distante, Mayen será sem dúvida uma boa opção. Hoje, já me imagino morando em um vilarejo (ou em uma cidade pequena, como meu marido prefere dizer... rsr), já me imagino fazendo compras nos meus lugares, nessas mesmas lojinhas desconhecidas, olhando as mesmas caras todos os dias, andando a pé sem a necessidade de tirar o carro da garagem. Enfim, é reconfortante constatar que o tempo e a maturidade foi capaz de me fazer mudar, até mesmo aquelas coisas que eu sequer imaginava. Menos mau que essas mudanças foram para melhor e fizeram uma diferença incrível na forma como vejo o mundo e as pessoas ao meu redor. Aprendi, finalmente, a enxergar a beleza de Mayen. Antes tarde do que nunca!



quinta-feira, 8 de maio de 2014

Então, a culpa é da vítima?

Eu não sei se estou ficando retrógrada, mas a verdade é que ando com muitas dificuldades em compreender  o ser humano, principalmente quando vejo toda essa violência que tem assolado o mundo ultimamente... Por conta do tema Violência, comecei um bate-papo saudável com uma conhecida, mas infelizmente acabou mesmo se transformando numa discussão bastante acalorada. 
Começamos a falar sobre as informações que são vomitadas diariamente pelos meios de comunicação e rapidamente invadem as redes sociais. Eu disse que a mídia tem o incrível poder de manipular pessoas, e com a proliferação das redes sociais, as notícias - verdadeiras ou não - tomam proporções assustadoras.
As pessoas hoje em dia não se dão mais ao trabalho de verificar se uma informação é proveniente de fonte idônea e se a pessoa que a postou é confiável. Isso, infelizmente, tem causado mal-entendidos gravíssimos; tem levado pessoas (pouco esclarecidas) a cometerem crimes hediondos, como esse que aconteceu sábado passado no Guarujá.
Minha conhecida discorda totalmente de minha opinião... Ok, é um direito dela! 

Ela simplesmente acha que a dona de casa que foi assassinada a socos, pontapés e pauladas no meio da rua por mais de cem pessoas foi morta dessa forma cruel e violenta porque algo de muito errado deve ter feito. Segundo minha conhecida, como a tal mulher sofria crises de bipolaridade, provavelmente era antissocial, possuía má índole e não era bem-vista pela sociedade... Tá, mas agora sou eu que discordo!

Eu repito, devo estar ficando com o raciocínio lento demais, porque sou incapaz de entender certas opiniões e atitudes. Custa-me muitíssimo acreditar que algumas pessoas ainda possam ter a mente como tinham aquelas que viviam na Idade da Pedra. Custa-me muitíssimo aceitar que alguém possa ter a vida ceifada pelo simples fato de não agradar a todo o mundo, por não fazer parte do rebanho.

Penso que o que falta no Brasil é educação, minha gente. A massa está sendo manipulada pela mídia pelo simples fato de não saber pensar, de não saber distinguir o real da ficção, o bom do ruim. O governo não investe na educação porque é muito mais fácil enganar e controlar um povo que tem o cérebro do tamanho de uma ervilha. Não investe na educação porque é muito mais fácil comprar o voto de alguém que tem a mente estagnada
.
Muito me entristece saber que a violência e a criminalidade têm crescido e tomado conta do meu país como um câncer, sem cura. Muito me entristece ligar a TV - do outro lado do mundo - e me deparar com imagens do meu país tal qual uma arena, onde feras avançam desesperadamente em busca de sangue. Muito me entristece saber que o país que eu tanto amo já não é mais o mesmo de outrora. Muito me entristece saber que pessoas, ditas evoluídas, agem como animais selvagens.

É uma grande pena que a humanidade esteja indo por esse caminho, que tenha decidido fazer justiça com as próprias mãos, se achando no direito de decidir sobre a vida e a morte de uma pessoa. Encerro meu desabafo usando as palavras de Deusa - minha querida irmã:

Isso que está acontecendo no Brasil tem vários nomes: ignorância, intolerância e FALTA DE AMOR. Temos de ter cuidado com a infâmia, a injúria e a maledicência, porque qualquer um de nós pode ser a próxima vítima da injustiça.

Aaaah, parem o mundo que eu quero descer! :(

terça-feira, 6 de maio de 2014

O negócio é facilitar...


Ontem, li um artigo da Folha de S. Paulo sobre um projeto da escritora Patrícia Secco, que tem como objetivo reescrever alguns clássicos da literatura. Algo nada inovador se levarmos em conta que existem por aí milhares de adaptações e resumos. Porém, foi com um quê de tristeza que cheguei à conclusão de que o grande problema da falta de leitura no Brasil, problema esse que aprisiona nossos jovens há anos, continua a ser tratado com o famoso jeitinho.
A escritora alega que algumas obras da literatura brasileira, como O Alienista, de Machado de Assis, por possuírem muitas palavras desconhecidas precisam ser simplificadas. A proposta dela é trocar essas palavras "difíceis" por outras mais "fáceis". Ela diz também que a modificação que fará no texto de Machado não mudará em nada o estilo do escritor, que a ideia é apenas tornar a leitura mais  acessível aos jovens leitores.

Para mim o projeto da escritora Patrícia Secco equivale a empurrar a sujeira para debaixo do tapete. S
abemos, infelizmente, que nossos jovens não leem quase nada. Não leem porque não foram habituados a isso. E eu acredito que o que deve ser feito, antes de mais nada, é estimular o gosto pela leitura desde a mais tenra idade, oferecendo textos mais simples para que o leitor se acostume a ler de forma natural, sem achar que é um fardo. Para isso há muito material disponível, pois vários escritores têm obras voltadas para o público infantil. Monteiro Lobato é um deles.
A criança pode iniciar sua caminhada no mundo da literatura por meio dessas obras, pelo menos até tomar o gosto pela leitura. Esse gosto pode ser estimulado pelos próprios pais, em casa mesmo: um gibi, um livro do Sítio do Picapau Amarelo, enfim, há infinitas possibilidades. Então, quando a criança finalmente chegar à adolescência, já terá maturidade literária suficiente para ler e entender "O Alienista", por exemplo. Ela pode, inclusive, usar um dicionário como apoio. Por que não? É muito melhor instruir que adaptar a obra  à falta de conhecimento do leitor.

Ora, se a leitura serve também para aumentar nosso vocabulário, não vejo sentido algum em substituir a palavra "sagacidade" por "esperteza", como fez a escritora. O trabalho de Patrícia Secco, que chegará ao leitor em junho, no lugar de ajudá-lo a pensar e expandir seus horizontes, faz o caminho inverso. O leitor é levado a não usar a própria cabeça, acostumando-se a receber o conteúdo mastigado.

Finalmente, eu não vejo esse projeto como um incentivo à leitura, mas como uma forma de mascarar algo que é visível a olho nu: nossos jovens não estão habituados a ler. Lástima.

E vocês, o que pensam sobre esse assunto?

quinta-feira, 1 de maio de 2014

O Livro dos Abraços - Eduardo Galeano

“Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas mãos, ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for. Porque todos, todos temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou perdoada.”

abrazos2O Livro dos abraços enganou-me com seu belo título que, de uma doçura sem igual, levou-me a pensar que se tratasse de uma novela romântica, meio água com açúcar. Engano mesmo, minha gente, pois o que Galeano oferece ao leitor é muito mais que isso, ele nos brinda com pequenos relatos que se encarregam de contar grandes histórias: histórias de dores, histórias de lutas, histórias de amores e de sobrevivência. Embora a maioria desses relatos esteja relacionado à política na época da ditadura no Uruguai, eles discorrem também sobre o amor, sobre a velhice, sobre o medo, sobre religião e sobre amenidades da vida.
O autor nos presenteia ainda com casos de sua própria vida na época em que ficou exilado na Espanha, mas fala também acerca de outras pessoas: famosas ou anônimas, queridas ou odiadas, admiradas ou ignoradas e, cada uma delas, à sua maneira, é relevante e pertinente para a obra.
Não é por Galeano tratar de assuntos sérios que sua escrita é seca, ao contrário, a cada pequeno relato tive a sensação de ser abraçada… abraçada por sua sensibilidade em enxergar beleza nas pequenas coisas, abraçada por sua capacidade de ver a vida a partir de diferentes ângulos, abraçada por sua escrita tão certeira, tão firme e, ao mesmo tempo, tão poética e linda.
Poderia ficar por horas mencionando os sentimentos variados que O Livro dos Abraços me proporcionou, no entanto, prefiro citar este trecho da obra que diz muito mais que qualquer coisa que eu pudesse escrever aqui:

O mundo é isso, um montão de gente, um mar de fogueirinhas. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo.
Sobre o autor: Transcrevo um relato do livro no qual ele mesmo se apresenta:

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“Assino Galeano, que é meu sobrenome materno, desde os tempos em que comecei a escrever. Isto aconteceu quando eu tinha dezenove anos, ou talvez apenas alguns dias, porque chamar-me assim foi um modo de nascer de novo.
Antes, quando era garoto e publicava desenhos, assinava Gius, por causa da difícil pronúncia espanhola de meu sobrenome paterno (meu tataravô galês se chamava Hughes, e aos quinze anos fez-se ao mar no porto de Liverpool e chegou ao Caribe, à República Dominicana, e tempos depois ao Rio de Janeiro, e finalmente a Montevidéu. Em Montevidéu atirou ao arroio Miquelete seu anel de maçom, e nos campos de Paysandú cravou as primeiras cercas de arame farpado e fez-se dono de terras e gentes, e morreu há mais de um século, enquanto traduzia Martin Fierro para o inglês).
Ao longo dos anos escutei as mais diferentes versões sobre essa questão de meu sobrenome escolhido. A versão mais boba, que ofende a inteligência, me atribui uma intenção antiimperalista. A versão mais cômica supõe fins de conspiração ou contrabando. E a versão mais fodida me converte na ovelha vermelha da família: inventa para mim um pai inimigo e oligárquico, no lugar do pai real que tenho, que é um sujeito bacana que sempre ganhou a vida com o trabalho ou com a boa sorte que tem na loteria.
O pintor japonês Hokusai mudou de nome sessenta vezes para celebrar seus sessenta nascimentos. No Uruguai, um país formal, teria sido enjaulado como louco ou perverso simulador de identidades.”

segunda-feira, 14 de abril de 2014

BookCrossing Blogueiro, 8-ª edição!


Mais uma vez começará o divertido BookCrossing Blogueiro, organizado pelo blogue Luz de Luma, Yes Party. 
O objetivo do BookCrossing Blogueiro é "libertar" livros de nossas estantes para que outras pessoas os possam ler também, estimulando assim o hábito da leitura.
Quem quiser entrar na brincadeira sinta-se convidado. É muito simples participar, basta apenas selecionar o livro que deseja passar adiante, colocar um bilhete dentro (modelo aqui) explicando que ele não está perdido, que deve ser lido e libertado outra vez... Fácil, né?!

Um dos livros que escolhi para libertar é O Castelo de Vidro, da jornalista norte-americana Jeannette Wallls.
O Castelo de Vidro foi-me enviado da Alemanha por uma querida amiga virtual (Obrigada, Nina!). O livro está agora em Hong Kong e ansioso para seguir circulando livremente por aí... Já o li e gostaria de oferecê-lo a outro leitor, porém de uma forma um pouco diferente: via correio.
Quem tiver interesse em lê-lo basta me avisar que eu o enviarei - para qualquer parte do planeta. A ideia é essa: receba, leia e passe adiante para que outras pessoas também o leiam - assim daremos continuidade ao BookCrossing e contribuímos um pouquinho mais com a propagação da leitura.
Fiquem atentos, a oitava edição do BookCrossing Blogueiro acontecerá de 16 a 23 de abril

     
Sobre o livro:

Editora Nova Fronteira
"O Castelo de Vidro é um impressionante relato de superação e amor. Neste surpreendente livro de memórias, a famosa jornalista norte-americana Jeannette Walls mostra como conseguiu lidar, até a adolescência com a excentricidade, a negligência e a falta de dinheiro dos pais.
Rex e Rose Mary Walls eram pais nada convencionais. Rex era um escritor fracassado, um homem brilhante e carismático. Sabia que sua família era especial e por isso sonhava em construir uma grande casa no deserto, O Castelo de Vidro. Compreendia perfeitamente a imaginação dos filhos. Ensinava-lhes física, geologia e, acima de tudo, como enfrentar a vida intrepidamente. Em uma noite de Natal, ofereceu a cada um deles uma estrela de presente. Mas, quando estava bêbado, Rex era desonesto e violento. Rose Mary,  pintora e escritora era uma mulher alheia às necessidades dos filhos e pensava mais na arte do que na comida e no bem-estar da família.
A princípio, os Walls viviam como nômades. Mudavam-se constantemente de uma cidade para outra, habitando armazéns abandonados e acampando nas montanhas. Praticamente todo o dinheiro vinha de bicos do pai, mesmo a mãe sendo uma professora diplomada. Mais tarde, quando não conseguiam mais se sustentar com suas fontes de renda incomuns - ou quando o glamour de uma vida de aventuras desapareceu - recolheram-se numa pequena cidade mineradora de Welch.
O pai fazia de tudo para fugir da realidade, bebia, roubava dinheiro de casa e passava dias desaparecido. A mãe nao ligava para os filhos. Assim, Jeannette aprendeu a sobreviver muito cedo. À medida que os problemas da família aumentavam, Jeannette, as duas irmãs e o irmão tinham que cuidar de si mesmos sozinhos - arranjavam comida, limpavam a casa e encorajavam os pais a trabalhar, enquanto se amparavam mutuamente e procuravam dar alguma normalidade às suas vidas. Quando finalmente Jeannette e os irmãos tomaram coragem para abandonar Welch e tentar o sucesso em Nova York, seus pais os seguiram e optaram, finalmente, por viver como sem-teto, mesmo enquanto os filhos prosperavam.
Durante vinte anos, sempre que alguém perguntava pela sua família, Jeannette Walls mudava de assunto. Nunca contava detalhes do seu passado. Neste livro ela finamente revela todos os segredos sobre suas origens. Mas, ao contrário do que se poderia imaginar, esta não é uma história triste. Sem qualquer resquício de autopiedade, Jeannette Wallls descreve suas aventuras de forma divertida, e seus pais, com profundo carinho e admiração.
O castelo de vidro é uma história de triunfo sobre todo tipo de adversidade, uma narrativa emocionante sobre o amor incondicional por uma família que, apesar de seus defeitos, deixou para Jeannette Walls uma rica herança: determinação para construir uma vida bem sucedida."


Outros livros que libertarei. Escolha o seu!


*No Teu Deserto - Miguel Sousa Tavares

Oficina do Livro
"Ali estavas tu, então, tão nova que parecias irreal, tão feliz que era quase impossível de imaginar. Ali estavas tu, exactamente como te tinha conhecido. E o que era extraordinário é que, olhando-te, dei-me conta de que não tinhas mudado nada, nestes vinte anos: como nunca mais te vi, ficaste assim para sempre, com aquela idade, com aquela felicidade, suspensa, eterna, desde o instante em que te apontei a minha Nikon e tu ficaste exposta, sem defesa, sem segredos, sem dissimulação alguma.
Foi ao terceiro dia de nossa viagem, na estrada entre Oran e Argel, Novembro de 1987."



*A Rapariga das Laranjas, Jostein Gaarder

Editora Presença
"Será possível um pai, falecido demasiado cedo, falar com o filho, através de uma carta? Esta é a experiência por que o protagonista desta história Georg Roed, de 15 anos, vai passar. Georg e o pai vão dialogar e manter finalmente a conversa de adultos que não puderam ter. Na carta, o pai de Georg fala-lhe de uma bela rapariga carregada com um saco de laranjas a quem procura incansavelmente, enquanto imagina a razão que a leva a atribuir um valor tão grande às laranjas que ele, desastradamente, fez rolar pelo chão num primeiro encontro. A Rapariga das Laranjas é um romance sob a forma de uma belíssima carta de amor de um pai que sabe não poder acompanhar o crescimento do seu filho e lhe quer transmitir o seu amor à vida e ao mistério insondável que ela encerra."


*Pequena Abelha - Chris Cleave

Editora Intrínseca
"Esta é a história de duas mulheres cujas vidas se chocam num dia fatídico. Então, uma delas precisa tomar uma decisão terrível, daquelas que, esperamos, você nunca tenha de enfrentar. Dois anos mais tarde, elas se reencontram. E tudo começa...
Depois de ler este livro, você vai querer comentá-lo com seus amigos. Quando o fizer, por favor, não lhes diga o que acontece. O encanto está sobretudo na maneira como esta narrativa se desenrola."



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